Três passos para resolver a crise do euro
George Soros
17/08/11
17/08/11
Uma solução abrangente para a crise da zona euro terá de englobar três componentes fundamentais, diz Soros.
A reforma e recapitalização do sistema bancário; um regime de euro-obrigações; e um mecanismo de emergência são essenciais, segundo o investidor norte-americano.
Em primeiro lugar, temos o sistema bancário. O tratado de Maastricht previu apenas desequilíbrios no sector público; mas os excessos no sector bancário privado têm sido bem mais graves. A introdução do euro levou a uma explosão do sector imobiliário em países como a Espanha e a Irlanda. Os bancos da zona Euro tornaram-se dos mais endividados do mundo e, continuam a ter necessidade de protecção dos riscos das suas contrapartes.
O primeiro passo tomado foi autorizar o Fundo Europeu de Estabilidade Financeira a salvar os bancos. Agora os níveis de capital próprio dos bancos terão de ser muito aumentados. Se uma agência garante a solvência dum banco, têm também de o supervisionar. Uma agência de supervisão bancária poderosa, a nível europeu, poderia acabar com a relação incestuosa entre bancos e agentes reguladores, interferindo mais nas políticas fiscais e menos na soberania de cada nação.
Em segundo lugar, a Europa necessita de euro-obrigações. A introdução do Euro supostamente reforçaria a convergência; na realidade, criou divergências, com níveis muitíssimo diferentes de dívida e competitividade. Se os países altamente endividados têm de pagar juros muito pesados, a sua dívida tornar-se-á insustentável. É o que se passa actualmente. A solução é óbvia: os países deficitários devem poder renegociar a sua dívida nas mesmas condições que os países excedentários.
Este passo pode ser conseguido através da emissão de euro-obrigações, que seriam seguras em conjunto pelos países membros. O princípio parece simples, mas os detalhes requerem muito trabalho. Que agência os emitiria e de acordo com que regras? Presumivelmente, as euro-obrigações seriam controladas pelos Ministros das Finanças da Zona Euro. Este conselho actuaria como contraparte fiscal do Banco Central Europeu; e seria a contraparte europeia do Fundo Monetário Internacional.
O debate centrar-se-á, pois, em torno do direito de voto. O BCE (Banco Central Europeu) opera segundo o princípio de um voto por país; o FMI dá direito de voto de acordo com as contribuições de capital. Qual destes métodos deve prevalecer? O primeiro poderia dar carta branca aos países deficitários para acumularem a sua dívida; o último poderia perpetuar uma Europa a duas velocidades. É necessário um compromisso entre os dois.
Como o futuro da Europa depende da Alemanha e como as euro-obrigações poriam a solvabilidade da Alemanha em risco, qualquer acordo irá colocar a Alemanha na cadeira da liderança. Infelizmente, a Alemanha tem ideias erradas sobre política macroeconómica e quer que a Europa siga o seu exemplo. Mas o que resulta na Alemanha pode não resultar no resto da Europa: nenhum país pode ter uma balança comercial cronicamente superavitária, sem que os outros apresentem défices. A Alemanha tem de concordar com regras pelas quais os outros países se possam também reger.
Estas regras devem conseguir obter uma redução global do endividamento. Devem também permitir aos países com altas taxas de desemprego, como a Espanha, gerir os défices orçamentais. Por exemplo, regras que estabeleçam objectivos para défices ciclicamente ajustados podem resolver amas as questões. Um ponto importante é que estas devem ser susceptíveis de correcção e melhoramento.
O Laboratório Económico Europeu e Mundial de Bruxelas propôs que as obrigações europeias constituam 60% da dívida externa dos membros da zona euro. Mas devido aos juros elevados persistentes na Europa, esta percentagem é demasiado baixa para conseguir condições de concorrência equitativas. Na minha opinião, as novas emissões de títulos deverão ser inteiramente de euro-obrigações, num limite decidido pelo Conselho.
Quantos mais euro-obrigações um país quiser emitir, mais severas devem ser as condições impostas pelo conselho. Este deverá ter competência para impor a sua decisão, pois a recusa de emissão de euro-obrigações adicionais terá de ter um poder dissuasivo final.
Isto leva directamente ao terceiro problema por resolver: o que acontece se um país não quiser ou não puder cumprir as regras acordadas? A incapacidade de emitir euro-obrigações poderia resultar num incumprimento público ou desvalorização. Na ausência de um mecanismo de emergência, isto pode ser catastrófico. Uma medida coerciva que é demasiado perigosa para ser invocada tem pouca credibilidade.
A Grécia constitui um exemplo de coacção e muito depende do desfecho da sua crise. É possível delinear uma saída viável para um país pequeno como este, mas que não será aplicável a um país de maior dimensão como a Itália. Na falta de uma saída viável e global, o regime terá de levar a cabo sanções às quais não se possa fugir - algo como um ministro das finanças europeu, que tenha legitimidade quer política, quer financeira. Tal resolução só poderá surgir após uma reflexão profunda sobre o Euro, tão necessária neste momento (especialmente na Alemanha).
Os mercados financeiros podem não oferecer as condições de moratória necessárias para pôr em prática os novos modelos. Mas sob uma pressão contínua dos mercados, o Conselho Europeu poderá ter de encontrar uma solução provisória ou temporária para evitar uma calamidade. Por exemplo, autorizar o BCE a emprestar dinheiro a governos que não tenham crédito, até estar instalado um sistema de emissão de euro-obrigações. Mas apenas uma coisa é certa: estes três problemas têm de ser resolvidos para manter o Euro como uma moeda viável.